- Deite-se. Ainda está muito branquinha.
- Aquele senhor simpático é seu marido?
- É o meu segundo marido.
- Gosto muito do seu segundo marido.
- Eu só não gosto de estar para aqui a servir cafés. Roubaram-me a minha arte aos trinta anos. Enfiaram-me um ferro na coluna.
- Qual era a sua arte?
- Eu era jardineira. Eu era jardineira. Eu era jardineira. Eu era jardineira...
- Que doença essa que a prende a um balcão?
- Chama-se artrite reumatóide. Dói. Mas sou feliz com o meu segundo marido.
- Tantas vidas por contar nestes corredores a correr, não é? Agora, atrás do balcão, será sempre a jardineira. Nunca mais será outra coisa. Para mim, é uma jardineira atrás do balcão.
- Vivi vinte anos com um alcoólico, uma cruz, só depois me libertei, agora sou feliz com o meu João. Vinte anos. Foram vinte anos. Vamos? Está melhorzinha.
- Vou. Olhe..
- Diga.
- Eu sei como é. Essa cruz. Mas não por vinte anos. Um dia explique-me a paz do seu olhar.
- Tem de se andar em frente.
- Vamos.
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