O que interessa é que há sempre rosas.
Sempre ouviu da boca de quem usava a sua a mesma frase: o que interessa é que há sempre rosas. Os dias passavam vistos tão de longe que o seu corpo magro ia pelo ar, como uma sombra côncava, para trás, para trás, para trás, enquanto o dia corria, lá fora, distante, longe de si, do seu ser uma pessoa.
O que interessa é que há sempre rosas, dizia-lhe a boca que fechava a noite com a tranca do medo e que caminhava até aos seus lençóis abafando a rua algures e o rasto dos eléctricos do bairro. O dia era uma vida árdua, lenta, demaisado lenta , sem promessa de outra vida, pior, com a certeza de uma mesma morte que sempre se repetia.
- Pousa a boneca.
- Está frio.
- Chega-te ao pé do tio, linda.
- Está muito frio e eu tenho medo.
- Eu não te faço mal.
- Hoje posso não imitar aquela cassete de vídeo?
- Linda, sabes que o tio precisa. Dá cá a mão.
- Eu tenho medo.
- Não chores. Não sejas piegas. Eu não te faço mal.
- Mas ISSO dói!
Apenas para os outros habitantes da casa amarelo gasto a manhã nasce subitamente. Cheira a leite quente com café. Os passos nas escadas são de quem quer que seja até serem os dele, porque esses batem no soalho como batem nas tábuas do quarto de todas as vésperas.
Olha pela porta quase aberta da cozinha:
- Passa-me o pão.
- O que tens?
- Nada, querida.
- Andas distante. Não me recordo da última que demos.
- Não me incomodes. Sabes bem que a enfermaria anda num alvoroço. Um homem não anda sempre de pau feito.
- Estás cada vez mais vulgar. O meu desejo por ti derrete como esta manteiga ao calor.
- E tu estás cada vez mais velha.
- A minha idade não avança sozinha, sabes?
- Pois sinto-me uma criança. Assim como a Mariana. Olha a pequena ali a espreitar atrás da porta.
- Vem cá, Mariana.
(Bom dia).
A dor é a dor do segredo. O segredo projecta-se no lugar exacto onde fixa o olhar aguado de oito anos envelhecidos. Por exemplo: a Mariana fixa os quadrados pretos e brancos do chão da cozinha e espalha a sua memória naquela geometria.
Todos os dias.
Sempre ouviu da boca de quem usava a sua a mesma frase: o que interessa é que há sempre rosas. Os dias passavam vistos tão de longe que o seu corpo magro ia pelo ar, como uma sombra côncava, para trás, para trás, para trás, enquanto o dia corria, lá fora, distante, longe de si, do seu ser uma pessoa.
O que interessa é que há sempre rosas, dizia-lhe a boca que fechava a noite com a tranca do medo e que caminhava até aos seus lençóis abafando a rua algures e o rasto dos eléctricos do bairro. O dia era uma vida árdua, lenta, demaisado lenta , sem promessa de outra vida, pior, com a certeza de uma mesma morte que sempre se repetia.
- Pousa a boneca.
- Está frio.
- Chega-te ao pé do tio, linda.
- Está muito frio e eu tenho medo.
- Eu não te faço mal.
- Hoje posso não imitar aquela cassete de vídeo?
- Linda, sabes que o tio precisa. Dá cá a mão.
- Eu tenho medo.
- Não chores. Não sejas piegas. Eu não te faço mal.
- Mas ISSO dói!
Apenas para os outros habitantes da casa amarelo gasto a manhã nasce subitamente. Cheira a leite quente com café. Os passos nas escadas são de quem quer que seja até serem os dele, porque esses batem no soalho como batem nas tábuas do quarto de todas as vésperas.
Olha pela porta quase aberta da cozinha:
- Passa-me o pão.
- O que tens?
- Nada, querida.
- Andas distante. Não me recordo da última que demos.
- Não me incomodes. Sabes bem que a enfermaria anda num alvoroço. Um homem não anda sempre de pau feito.
- Estás cada vez mais vulgar. O meu desejo por ti derrete como esta manteiga ao calor.
- E tu estás cada vez mais velha.
- A minha idade não avança sozinha, sabes?
- Pois sinto-me uma criança. Assim como a Mariana. Olha a pequena ali a espreitar atrás da porta.
- Vem cá, Mariana.
(Bom dia).
A dor é a dor do segredo. O segredo projecta-se no lugar exacto onde fixa o olhar aguado de oito anos envelhecidos. Por exemplo: a Mariana fixa os quadrados pretos e brancos do chão da cozinha e espalha a sua memória naquela geometria.
Todos os dias.
Mas não hoje, porque a Mariana morreu de manhã.
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